A equipe de uma clínica do sono na França coloca cabos de monitor em um paciente em preparação para uma polissonografia. Esse exame é considerado o padrão-ouro para diagnosticar a apneia do sono, um distúrbio que faz com que as pessoas parem de respirar à noite.
Os seres humanos fazem muitas coisas enquanto dormem. Alguns de nós falam, outros se levantam e andam. Muitas vezes sonhamos. Uma coisa que todos nós fazemos, centenas de vezes, todas as noites, é respirar.
A interrupção das inspirações e expirações pode matar em minutos, o que implicaria que respirar durante o sono deveria ser algo óbvio. Mas cerca de 15% a 30% dos homens e 10% a 15% das mulheres param de respirar durante o sono, várias vezes por hora, durante toda a noite.
A condição é formalmente conhecida como apneia obstrutiva do sono, e ocorre quando a via aérea entra em colapso durante o sono. Embora seja mais comum em homens, adultos mais velhos e pessoas com obesidade, a condição também pode afetar pessoas de todas as formas e tamanhos, inclusive crianças. Ligada a problemas de saúde como doenças cardíacas, diabetes e demência, o tratamento da apneia do sono é uma prioridade, alerta Lee Surkin, fundador da American Academy of Cardiovascular Sleep Medicine.
"Ela tem efeitos sobre o metabolismo e promove o ganho de peso, o que pode piorar a apneia do sono. É um ciclo vicioso", acrescenta Surkin.
Os perigos da apneia do sono são claros, mas os especialistas dizem que um dos maiores desafios para evitá-los é saber que você precisa fazer o exame.
Mais de 20 000 vezes por dia, os pulmões puxam o ar rico em oxigênio para o corpo e expulsam o dióxido de carbono. Em ambos os sentidos, a respiração de uma pessoa passa pelas vias aéreas. Se as vias aéreas forem bloqueadas enquanto você estiver acordado, por exemplo, por uma migalha de comida inalada, você tentará desobstruí-las imediatamente.
Se as vias aéreas forem bloqueadas regularmente durante o sono, seja por colapso sobre si mesmas ou por bloqueio físico da língua ou das amígdalas, isso é conhecido como apneia do sono. Uma onda de adrenalina sinaliza ao cérebro a queda de oxigênio e o consequente aumento do dióxido de carbono.
Seu cérebro percebe isso e diz: "cara, acorde. Você vai morrer", explica Robson Capasso, médico especialista em medicina do sono da Universidade de Stanford, EUA. Esse aviso do cérebro faz com que você respire fundo.
"Isso é uma questão de sobrevivência", diz Surkin. "Ele aumenta a energia de seu corpo. Faz com que você contraia os músculos para forçar a abertura das vias aéreas."
Quando alguém está dormindo profundamente, geralmente não se lembra desses episódios. Em vez disso, geralmente é o parceiro de cama que testemunha o problema.
"Pode parecer que a pessoa está lutando para respirar, e o parceiro dirá: 'tenho medo de que você morra porque não está respirando'", exemplifica Lois Krahn, especialista em sono da Mayo Clinic, no Arizona, EUA.
Mas, com o tempo, isso afeta o corpo.
"O corpo é colocado em alerta. O coração trabalha mais e o cérebro acorda", diz Krahn. "Como consequência, eles dormem mal à noite, não se sentem revigorados pela manhã e se sentem cansados durante o dia."
Pessoas com apneia do sono leve ou moderada podem ter apenas alguns episódios por hora. As pessoas com casos graves podem ter centenas de episódios por hora.
Em curto prazo, isso pode causar sonolência diurna, dores de cabeça, fadiga e falta de atenção. Pessoas com pressão alta ou diabetes podem achar que essas outras condições são resistentes ao tratamento.
A sonolência diurna e a fadiga que muitas pessoas com apneia do sono sentem podem causar problemas diretamente. Pessoas cansadas têm maior probabilidade de sofrer acidentes de carro e com máquinas.
Isso também pode levar a problemas cognitivos e de memória, além de depressão e irritabilidade. Uma meta-análise de estudos publicados anteriormente no Journal of Sleep Research constatou que, em geral, os indivíduos com apneia do sono tinham 1,43 vezes mais risco de desenvolver um distúrbio neurocognitivo, como as doenças de Alzheimer ou Parkinson.
"Ele corta seu sono em um milhão de pedaços, como um alarme que dispara a cada 10 segundos no seu quarto, a noite toda, todas as noites, quando você dorme. Então, você pode imaginar como isso pode ser devastador para o descanso e a recuperação de alguém", cita William Winter, especialista em medicina do sono em Charlottesville, Virgínia, EUA.
Há outras consequências também. O aumento constante dos hormônios do estresse pode causar ritmos cardíacos anormais, conhecidos como arritmias cardíacas, bem como um aumento da frequência cardíaca.
A apneia também pode causar uma série de problemas metabólicos. Um estudo publicado no Journal of Clinical Endocrinology and Metabolism descobriu que as pessoas com apneia do sono não tratada também apresentavam aumentos nos níveis de açúcar no sangue, no hormônio do estresse cortisol e nos ácidos graxos no sangue, o que pode aumentar o risco de doenças cardiovasculares e diabetes.
Para Winter, esse e outros estudos mostram que a apneia do sono não é apenas o resultado de problemas de saúde, ela também pode exacerbar problemas metabólicos existentes e/ou criar novos problemas.
A condição pode ser causada por uma série de fatores, cita Capasso. Os pesquisadores acreditam que as três principais causas da apneia do sono são a idade avançada, ser do sexo masculino e ter excesso de peso corporal, especialmente em torno do rosto e da garganta.
"Esses são fatores de risco significativos para a colapsabilidade da garganta durante o sono", alerta Capasso.
Mas seria um erro pensar que, se você não for um homem mais velho e pesado, não corre o risco de ter apneia do sono. Até mesmo crianças podem ser diagnosticadas com a doença, diz Winter. Outros estudos descobriram predisposições genéticas para a apneia do sono, embora os cientistas ainda estejam descobrindo o conjunto completo de genes ligados à apneia do sono e como eles funcionam.
Há também explicações anatômicas. Algumas pessoas podem ter amígdalas e adenoides (tecidos na parte de trás da garganta que desempenham um papel na imunidade) excepcionalmente grandes. Outras podem ter uma estrutura facial que deixa menos espaço para a língua e a mandíbula relaxarem durante o sono. Mesmo nos melhores momentos, as vias aéreas de uma pessoa podem ser simplesmente pequenas.
"Então, quando os músculos relaxam por causa do sono, ela fica ainda menor", explica Krahn.
Muitos sintomas, como ronco, fadiga e dores de cabeça matinais, podem ser causados por uma variedade de condições. É por isso que David Kuhlmann, membro da diretoria da American Academy of Sleep Medicine, diz que o diagnóstico da apneia do sono é tão importante.
É necessário fazer um estudo do sono para diagnosticar a apneia do sono. Historicamente, esses estudos eram realizados apenas por meio de um polissonograma, que registra as ondas cerebrais, a frequência cardíaca, a respiração e os níveis de oxigênio no sangue. Esses exames são feitos à noite, em um laboratório especializado em sono, e fornecem o que os especialistas em sono dizem ser os dados padrão-ouro sobre se um indivíduo tem algum distúrbio do sono, não apenas apneia do sono.
Mas nem todo mundo quer ou precisa de um estudo tão aprofundado. Nos últimos anos, os testes de sono feitos em casa se tornaram mais populares. Eles não medem o sono, mas sim a respiração, usando uma pequena máscara, um oxímetro de pulso no dedo e outros sensores no peito e no abdômen. Juntos, os equipamentos podem determinar o quão bem você está respirando e o esforço necessário para que suas vias aéreas se abram durante o sono. Se os resultados forem inconclusivos, seu médico poderá solicitar um estudo de acompanhamento em laboratório, explica Surkin.
Especialmente para pessoas com apneia do sono mais grave, o tratamento mais eficaz é conhecido como CPAP, ou pressão positiva contínua nas vias aéreas. A máquina "é um pequeno compressor de ar", explica Capasso, e pega o ar do ambiente e o empurra por uma máscara usada sobre o nariz e a boca durante o sono. A potência extra da máquina significa que o ar força sua garganta a permanecer aberta.
O desafio para os especialistas do sono é ajudar seus pacientes a identificar o estilo de máscara que preferem usar e a identificar a pressão que o CPAP deve fornecer. Alguns modelos mais novos ajustam a pressão do ar automaticamente, diz Kuhlmann.
"A pessoa que inventou o CPAP merece o Prêmio Nobel porque não consigo pensar em muitas outras pessoas que mudaram o curso da história mais do que ela", destaca.
Mas nem todo mundo pode ou quer usar uma máscara de CPAP, diz Krahn, e nem todos receberão o mesmo benefício do CPAP. Nesse caso, outros métodos ainda podem ajudar, especialmente para aqueles com apneia do sono leve a moderada.
Muitos especialistas em sono dizem que alguns de seus pacientes se beneficiam da perda de peso, o que pode facilitar a abertura das vias aéreas. Os dentistas podem fornecer protetores bucais especiais ou aparelhos orais para manter a mandíbula e a língua em uma posição avançada durante o sono. E para as pessoas que dormem de costas, a mudança para dormir de lado também pode reduzir os episódios.
Opções mais invasivas incluem cirurgia para remover amígdalas e adenoides que podem bloquear as vias aéreas ou para alterar a anatomia facial, que pode interferir na respiração durante o sono. Outra opção, diz Capasso, é um estimulador do nervo hipoglosso. Esse dispositivo é implantado sob a pele para fornecer estímulo aos nervos que controlam o movimento da língua e evitar que ela interfira na respiração.
A boa notícia, diz Winter, é que muitas pessoas com apneia do sono sentem os benefícios do tratamento quase imediatamente.
"As pessoas ficam mais saudáveis e se sentem melhor com relativa rapidez. É algo muito gratificante", destaca.