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\'Dinamitar\' Banco Central, venda de órgãos e fim da educação obrigatória: as propostas radicais de Javier Milei

Publicada em 14/08/23 às 20:29h - 41 visualizações

por Kativa FM \\ BBC


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Javier Milei foi o inesperado vencedor das eleições primárias da Argentina  (Foto: Kativa FM \\ BBC)

"Não vim guiar cordeiros, vim despertar leões."

Foi com esta frase que o candidato à Presidência da Argentina Javier Milei, representante do partido La Libertad Avanza, definiu sua surpreendente vitória neste domingo (13/08), nas eleições primárias do país.

Com 30% dos votos, Milei, de 52 anos, tornou-se assim o favorito para vencer as eleições presidenciais, que ocorrerão em 22 de outubro.

O candidato, que se define como libertário, superou as duas forças que governaram o país nas últimas duas décadas: o macrismo (Juntos por El Cambio), que obteve 28% dos votos; e a coalizão peronista-kirchnerista, Unión por la Patria, que obteve 27%.

Mas, embora o resultado seja surpreendente — as pesquisas não davam a ele nem 20% de intenção de votos —, a verdade é que Milei já tinha se tornado um fenômeno político polêmico na Argentina nos anos recentes.

Parlamentar desde 2021, economista e amante de cachorros, Milei tem agitado os debates políticos com propostas como a dolarização da economia, a privatização de estatais e o fechamento (ou "dinamitar", em suas palavras) do Banco Central.

Ele também já anunciou ideias como a permissão à venda de armas e órgãos humanos.

Soma-se a isso sua oposição à legalização do aborto e à educação sobre questões de gênero nas escolas públicas.

Milei é frequentemente comparado com outros políticos da direita radical, como o ex-presidente dos Estados Unidos Donald Trump e o brasileiro Jair Bolsonaro.

"Conseguimos construir uma alternativa competitiva que não só vai acabar com o kirchnerismo, mas também com a ladra casta política e inútil que existe neste país", disse o candidato, pouco depois do resultado das primárias ter sido divulgado.

Afinal, qual são as propostas de Milei — e as fortes críticas a elas? Confira.

Javier Milei discursando em evento político Milei foi catapultado por programas de TV como analista de economia

'Dinamitar o Banco Central'


A Argentina vive uma situação crítica devido à alta inflação que, no ano passado, chegou a 100% na inflação anual.

E foi na economia que a figura de Milei foi impulsionada: formado como economista da Universidade de Belgrano, ele participou várias vezes como analista de economia em programas de televisão.

Nessas participações, ele foi construindo o que é a base de sua proposta econômica: primeiro, a dolarização da economia, imitando o modelo de outros países da região como o Equador.

"Os equatorianos estão muito melhores que os argentinos. Os números do Equador impressionam. A renda multiplicou por dez e a inflação foi pulverizada", disse Milei ao jornal espanhol El País.

Em segundo lugar nas propostas está o fechamento do Banco Central. Milei já defendeu em várias entrevistas que a criação da instituição, em 1935, foi o início de todos os problemas do país.

Terceiro: a redução nos gastos públicos. Nessa linha, Milei quer reduzir o número de ministérios para apenas oito (atualmente são 18 ministérios, sem contar outras agências estatais).

Colagem com quatro fotos de candidatosJavier Milei (no canto inferior direito) ficou à frente de Sergio Massa, Patricia Bullrich e Horacio Rodriguez

O candidato do La Libertad Avanza propõe a redução dos subsídios às empresas prestadoras de serviços e que o valor da tarifa real seja repassado aos usuários.

Outra proposta é abolir o limite da quantidade de dólares que um cidadão argentino pode adquirir por mês.

Essas propostas, principalmente a dolarização do país e o fechamento do Banco Central, receberam fortes críticas de outros analistas econômicos.

"A proposta de fechar o Banco Central significa voltar a uma discussão já travada há dois séculos", disse o economista Guido Agostinelli ao jornal Página 12.

Agostinelli argumentou que o Estado precisa regular o mercado financeiro para proteger a poupança dos cidadãos e que não existe país desenvolvido sem banco central

"A experiência mais recente em que os depósitos dos poupadores não puderam ser garantidos foi com o corralito [medida de 2001 que determinou o congelamento dos depósitos bancários e limites semanais para saques] de Domingo Felipe Cavallo à frente do Ministério da Economia, o que é hoje justamente reivindicado por toda a ala libertária."

Armas e venda de órgãos

Javier Milei apertando a mão de apoiador
'No meu governo, não haverá marxismo cultural e não pedirei perdão por ter pênis', declarou Milei, referindo-se a questões de gênero

Mas, além de suas propostas econômicas radicais, é no campo social e dos costumes que as ideias de Milei têm causado maior agitação.

Em várias ocasiões, especialmente durante a campanha presidencial, Milei afirmou ser a favor de que os argentinos possam comprar armas livremente, justificando para isso o aumento de incidentes de segurança em algumas áreas do país.

O candidato já falou também a facilitação para outro mercado: o da venda de órgãos, atividade atualmente proibida.

"Há 7.500 pessoas sofrendo, esperando por transplantes. Tem alguma coisa que não está funcionando bem. O que proponho é procurar mecanismos de mercado para resolver este problema", disse o candidato ao canal de televisão TN.

A proposta foi categoricamente rejeitada por Carlos Soratti, diretor do Instituto Central Coordenador Nacional de Ablação e Implantação (Incucai), órgão que regulamenta a doação de órgãos no país.

"Essas propostas exóticas, que já eram colocadas há um século, hoje são absurdas", disse Soratti em um comunicado.

Enquanto isso, vários meios de comunicação denunciaram um comportamento agressivo de Milei contra mulheres jornalistas. Seu programa de governo se opõe a várias iniciativas relacionadas ao gênero.

"No meu governo, não haverá marxismo cultural e não pedirei perdão por ter pênis. Se dependesse de mim, fecharia o Ministério da Mulher", disse o candidato em entrevista.

A candidata à Vice-presidência na chapa de Milei, Victoria Villarruel, também é conhecida por declarações e propostas polêmicas.

Victoria Villarruel sorrindo contidamenteVictoria Villarruel é o segundo nome na chapa de Javier Milei

Villarruel é filha de militares e já colocou em dúvida os crimes cometidos durante o regime militar — como a tortura e o desaparecimento de milhares de pessoas — que governou a Argentina, de 1976 a 1983.

"Devemos denunciar os terroristas que realizaram ataques nos anos 70, tomaram o poder, reescreveram a história e garantiram a impunidade", disse ela durante um encontro político.

É ela quem lidera as propostas de flexibilização do comércio de armas e de uma reforma judicial que pode dar liberdade a dezenas de militares e policiais condenados por crimes contra a humanidade.

Verónica Torrás, diretora do instituto Memoria Aberta (voltado para a defesa dos direitos humanos), repudiou a proposta.

"Estamos em uma situação de ameaça ao consenso mínimo, que é o repúdio ao terrorismo de Estado", disse Torrás em entrevista ao jornal espanhol La Verdad.

Fusão dos ministérios da Saúde e Educação

Dentro da proposta de redução de gastos públicos, Milei tem deixado claro que haverá cortes nas principais áreas sociais: saúde, educação e desenvolvimento social.

Ele quer aglutinar os três ministérios que tratam dessas questões em um só, que se chamaria de "Capital Humano".

Na área da saúde, ele propõe a criação de um "seguro universal", em que os usuários e médicos chegariam a um acordo sobre valores pelos serviços médicos.

No campo da educação, Milei propõe o sistema dos vouchers, no qual a educação não seria nem obrigatória nem gratuita.

"O sistema obrigatório não funciona. Se você quiser estudar, terá um voucher e poderá estudar. O dinheiro que o Estado separa para isso seria dividido entre as crianças em idade escolar e um voucher seria entregue aos pais, para que eles possam escolher a escola que querem para os seus filhos" disse o candidato.

Professora de carreira e atualmente parlamentar, Victoria Morales Gorleri foi uma das pessoas que se manifestaram contra o projeto.

"A educação obrigatória não é uma arma que se coloca na cabeça da sociedade, mas um estímulo essencial para a sobrevivência", avaliou Gorleri.




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