Boris Nadezhdin, de 60 anos, discreto veterano da política russa, surpreendeu ao conseguir mobilizar milhares de russos que desejam a paz na Ucrânia e anunciar que pretende desafiar Vladimir Putin nas eleições presidenciais de março.
Em um país onde criticar o Kremlin é algo punido com a prisão, sua candidatura representa um pouco de ar fresco para os cidadãos anônimos que buscam uma forma de expressão sem colocar a liberdade em risco.
Nadezhdin apresentou, nesta quarta-feira, 31, à Comissão Eleitoral, mais de 100.000 assinaturas de apoio, uma etapa obrigatória para validar sua candidatura.
"Muito obrigado aos que acreditaram em nós", declarou à imprensa. "Ninguém acreditava há um mês e algumas ainda duvidavam há duas semanas".
"Milhões de pessoas apoiam", acrescentou.
A Comissão Eleitoral deve tomar uma decisão em um prazo de 10 dias, durante o qual verificará a "autenticidade" das assinaturas apresentadas.
Em uma entrevista à AFP na semana passada, Nadezhdin chamou de "pesadelo" a ofensiva russa contra a Ucrânia e denunciou os 25 anos de guinada autoritária de Putin.
"Minha candidatura dá às pessoas uma oportunidade única de protestar legalmente contra a política atual", afirmou.
Entre suas promessas eleitorais estão o fim dos combates, acabar com a "militarização" da Rússia e libertar "todos os prisioneiros políticos", como o opositor Alexei Navalny.
Este opositor quase desconhecido afirma não saber por que escapou da prisão até agora, enquanto outros militantes foram presos por declarações como as suas. Talvez Putin "não me considere uma ameaça terrível", admite.
O Kremlin não esconde o desprezo por Nadezhdin. "Não o consideramos um adversário", declarou Dmitri Peskov, porta-voz do presidente russo.
Pouco falado fora do pequeno ambiente liberal, Nadezhdin afirma que tomou a decisão de disputar a eleição em outubro, depois que nenhuma figura anti-Putin de destaque tomou a iniciativa.
Ele cita entre como opositores de renome o ex-prefeito Ekaterimburgo Yvgueni Roizman e o vencedor do Nobel da Paz e diretor do jornal Novaia Gazeta, Dmitri Muratov.
"Sei que será duro vencer Putin", admite Nadezhdin, que espera um bom resultado, algo que signifique o "início do fim" da era do presidente russo.
Ao longo dos últimos 30 anos, Nadezhdin teve uma carreira pública discreta, incluindo o papel de conselheiro de figuras conhecidas.
Sem considerar um breve período como deputado na Câmara Baixa do Parlamento (2000-2003), as suas funções eletivas limitaram-se ao cenário local.
Ele ainda é representante municipal de Dolgoprudni, cidade que fica a 20 quilômetros de Moscou, para onde seus pais se mudaram em 1969, quando ele tinha seis anos.
Nascido em 1963 no Uzbequistão soviético, filho de uma mãe professora de música de origem judaica e de um físico russo, em um primeiro momento ele seguiu os passos do pai.
"Feliz ou infelizmente, eu cantava muito mal e desde pequeno queria ser físico", afirmou em outubro.
Formado em Física, e depois em Direito, ele conquistou o primeiro mandato como vereador de Dolgoprudni em 1990.
Entre 1997 e 1999, segundo sua biografia oficial, trabalhou com Boris Nemtsov, que foi um opositor de Putin até seu assassinato em 2015.
Boris Nadezhdin colaborou em seguida com Serguei Kirienko, então primeiro-ministro liberal e atualmente figura importante do Kremlin.
O opositor afirma que trabalhou com Putin durante seu primeiro mandato, mas que rompeu relações em 2003, durante a detenção do opositor e CEO do grupo Yukos, Mikhail Khodorkovski.
"Há décadas que eu critico Vladimir Putin, que concentro muito poder em suas mãos", afirma Nadezhdin.