Durante décadas, as cidades australianas de Perth, Sydney e Melbourne foram elogiadas como alguns dos lugares mais habitáveis do planeta. Mas, nos últimos anos, milhares de “continentais” têm se mudado para Hobart, a capital da Tasmânia, e os problemas climáticos são citados por muitos como o principal motivo da mudança.
Adi Munshi, que se mudou de Perth, é um deles. “Os verões eram muito, muito quentes. Sou uma pessoa que gosta de montanhas – você não pode sair para fazer caminhadas em temperaturas de [40ºC]", afirma ele.
Munshi estava pensando em se mudar para a Nova Zelândia para fugir do calor. Mas as pessoas me perguntavam: “Por que você não considera a Tasmânia?”, diz ele. Agora, Munshi e sua esposa moram em Kingston, um subúrbio da cidade de Hobart.
“Tem sido absolutamente incrível. Em 90 minutos você pode estar em vários parques nacionais. Há muitas oportunidades para fazer caminhadas”, conta ele.
Com cerca de 250 mil habitantes, Hobart desfruta de um clima temperado durante todo o ano, alimentado por sua latitude ao sul e seus arredores marítimos. Cerca de 45 mil pessoas devem se mudar para lá somente na próxima década, muitas delas atraídas pelas temperaturas confortáveis.
Hobart não está sozinha. Em todo o mundo, a elevação das águas, as secas prolongadas, o clima extremo e as temperaturas mais altas estão prestes a tornar regiões inteiras inabitáveis. No entanto, algumas cidades estão preparadas para emergir como refúgios contra essas mudanças extremas e estão tomando medidas proativas para se preparar para um futuro instável.
Em um dia claro, o cume de 4.170 pés de altura do Monte Wellington / Kunanyi oferece vistas panorâmicas de Hobart. A capital da Tasmânia está se tornando um destino para os australianos que buscam alívio para o clima cada vez mais quente.
O Oriente Médio, grande parte do Paquistão e outras regiões do mundo propensas a altas temperaturas e muita umidade podem estar particularmente em risco. Uma pesquisa publicada no mês passado descobriu que os seres humanos são mais vulneráveis a temperaturas quentes e úmidas do que se pensava anteriormente, já que nossa capacidade de termorregulação – de nos resfriarmos – agora é entendida como atingindo uma temperatura mais baixa do que a estimada anteriormente.
Se as temperaturas continuarem a subir conforme o esperado, áreas do planeta nas zonas tropicais e subtropicais poderão se tornar inabitáveis.
O Banco Mundial estima que, até 2050, 216 milhões de pessoas poderão ser deslocadas pelas mudanças climáticas em seus próprios países. Mas, por sorte da geografia, algumas partes do mundo serão menos afetadas pelas mudanças climáticas.
Localizada no coração da Europa continental, Viena, a capital da Áustria, possui espaços públicos de renome mundial e um suprimento de água proveniente diretamente dos Alpes austríacos. Embora o país ainda sofra impactos climáticos, como clima imprevisível e calor escaldante no verão, ele está se adaptando ativamente às mudanças climáticas.
Viena adotou seu primeiro programa de "proteção climática" em 1999 e conta com um importante sistema de mitigação de inundações que protege os residentes da subida das águas do rio Danúbio. Em 2020, a cidade deu início às suas primeiras áreas de "proteção climática", nas quais os novos edifícios só podem ser construídos com sistemas de aquecimento e de água favoráveis ao clima. Atualmente, mais da metade da cidade é composta por espaços verdes.
O gramado do lado de fora do Museu de História da Arte de Viena, na Áustria, é um dos muitos espaços verdes acessíveis ao público.
A infraestrutura habitacional da cidade também faz com que Viena esteja bem posicionada para lidar com um fluxo de migrantes que fogem dos efeitos da mudança climática. Nos últimos anos, Viena adotou uma política de imigração rigorosa, mas o país ainda registra migração sem documentos. Muitos residentes também são nascidos no exterior, o que tende a levar ao movimento chamado migração em cadeia, no qual os parentes se juntam a membros da família já estabelecidos em um novo país.
No início dos anos 2000, Viena dobrou o número de unidades habitacionais acessíveis que construía, chegando a cerca de 10 mil por ano. “Atualmente, o estoque de moradias subsidiadas é de quase 200 mil unidades. Portanto, metade da população vienense vive em moradias públicas ou subsidiadas”, diz Amila Širbegović, arquiteta e especialista em moradias da Prefeitura de Viena.
E, no entanto, os relatórios sugerem que a grande maioria dos refugiados do clima em todo o mundo não poderá se mudar para metrópoles distantes como essas.
Uma combinação de falta de recursos, políticas rígidas de imigração dos países mais ricos e ausência de leis internacionais que protejam os refugiados do clima significa que, para muitos, as soluções para lidar com um ambiente mais quente e menos estável terão que começar e terminar em casa.
É exatamente isso que está acontecendo na província de Sindh, no Paquistão. No ano passado, enchentes catastróficas mataram mais de 1 mil 700 pessoas, e a região foi temporariamente o lar de um quarto dos desabrigados do mundo.
“As pessoas não podem se mover”, afirma Yasmeen Lari, a primeira arquiteta do Paquistão e fundadora da Heritage Foundation of Pakistan. “Quando a água recua, elas têm que se reassentar na mesma área; elas não têm escolha.”
Mas Lari implementou um plano para ajudar muitas das pessoas em pior situação no Paquistão. Desde as enchentes, sua fundação ajudou a construir mais de 6 milcasas de bambu resistentes ao clima em plataformas de palafitas em 13 vilarejos na província de Sindh e em outras regiões.
Ela diz que essas estruturas comprovadamente funcionam. Em 2014, cerca de mil casas semelhantes foram construídas na cidade de Kot Diji, no rio Dhoro, na província de Sindh. “Fomos visitá-los depois que a água baixou (no ano passado) e todos sobreviveram”, conta ela. “Tudo estava seguro, tudo estava bem quando a água baixou.”
Algumas cidades enfrentarão tanto as perturbações climáticas quanto um fluxo de refugiados.
À medida que o mundo se aquece, Singapura fica vulnerável a condições climáticas extremas e à elevação dos mares, mas também é provável que se torne um refúgio climático para muitos no sudeste da Ásia. As oportunidades econômicas e a alta qualidade de vida de Singapura já atraem imigrantes – quase metade de seus residentes nasceu no exterior. As ambiciosas políticas climáticas da cidade estão prontas para aumentar seu apelo.
Em Singapura, um esforço maciço para transformar partes da cidade-estado em uma "selva urbana" significa que 46% da cidade foi transformada em espaço verde. Isso reduz o perigoso efeito de ilha de calor alimentado pelo concreto e pelo asfalto e atua como um sistema de ar condicionado natural. Singapura também está gastando dezenas de bilhões de dólares em muros e sistemas de defesa oceânica.
Entretanto, o que está claro, dizem os observadores, é que nenhum lugar na Terra escapará dos efeitos de um planeta em aquecimento.
Como a popularidade de Hobart, na Tanzânia,sendo chamada de paraíso climático já é parcialmente responsável pelo crescimento populacional da cidade, os planejadores urbanos estão se preparando para receber mais milhares de residentes nos próximos anos. A cidade diz que precisa de quase 30 mil residências a mais, e os especialistas acreditam que a destinação de espaços urbanos não utilizados para manter a cidade compacta trará benefícios ambientais, sociais e econômicos.
“A Greater Hobart Strategy busca acomodar 70% do crescimento populacional dentro da área urbana existente”, diz Jason Byrne, professor de geografia humana e planejamento da Universidade da Tasmânia. “Concentrar a densidade dentro da área de crescimento existente é senso comum.”
Mas as temperaturas médias da Tasmânia devem aumentar um pouco até 2100. Seu setor de esportes de inverno já foi afetado pelos invernos quentes, enquanto os incêndios florestais e a seca estão aumentando seu impacto. "Hobart é uma das cidades mais propensas a incêndios na Austrália", afirma Byrne.
À medida que mais migrantes climáticos se mudam para lá, o tráfego piora e os custos de moradia disparam. O fato de muitos dos edifícios da cidade estarem mal preparados para o aumento das temperaturas é uma preocupação.
“Nossa sala de estar se transforma em uma fornalha assim que a temperatura atinge [20ºC] e, no inverno, fica gelada”, conta Adi Munshi. “Isso vai continuar a piorar, a menos que façamos grandes mudanças.”