A Organização das Nações Unidas (ONU) divulgou, nesta quarta-feira (12/07), o relatório que aponta para o crescimento da fome no Brasil e no mundo.
Cerca de 70,3 milhões de brasileiros (32,8% da população) encontram-se em situação de insegurança alimentar. Já o número de pessoas que não têm o que comer (um estado mais grave de insegurança alimentar) é estimado em 21 milhões (9,9%), de acordo com informações coletadas entre 2020 e 2022.
Os números representam um aumento em comparação com os dados de 2014 a 2016. Naquele período, a porcentagem da população que enfrentava insegurança alimentar estava em 18,3% (contra os 32,8% atuais).
No mundo, são 3,1 bilhões de pessoas em insegurança alimentar e 783 milhões passando fome, revelam os dados da ONU. A região mais afetada é a África, continente em que um a cada cinco indivíduos sofre de fome. Esse número é mais do que o dobro da média mundial.
Em 2015, a Organização das Nações Unidas (ONU) estabeleceu três ambiciosas metas: acabar com a fome mundial, alcançar a segurança alimentar e a melhoria da nutrição global – tudo até o fim da década. Os pontos integram o objetivo número 2 dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Agenda 2030 da ONU.
Nos últimos anos, vários fatores desviaram o mundo desse objetivo pleiteado pela ONU, aumentando os cenários de insegurança alimentar no mundo. Conflitos cada vez mais violentos, crises econômicas e os efeitos da pandemia de Covid-19 são alguns dos fatores apontados pela organização como responsáveis pela piora na alimentação mundial.
O relatório O Estado da Segurança Alimentar e da Nutrição do Mundo 2021, feito pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), mostra que o número de pessoas afetadas pela fome globalmente subiu para cerca de 828 milhões em 2021, um aumento de 150 milhões desde 2019, ou seja, antes da pandemia.
O relatório de 2021 também mostra que, no mundo, cerca de 2,3 bilhões de pessoas estavam em insegurança alimentar moderada ou grave e quase 924 milhões enfrentam níveis mais preocupantes de falta de alimentos. Mas para entender a gravidade do problema, primeiro é preciso analisar o que significa dizer que uma pessoa está em situação de insegurança alimentar – e como ela se relaciona com a questão da fome.
Voluntários embalam alimentos para distribuição no CENTI. Queens, New York, Estados Unidos.
FOTO DE NATALIE KEYSSARA insegurança alimentar acontece quando as pessoas não têm acesso regular e permanente a alimentos em quantidade e qualidade suficiente para sua sobrevivência, como define a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO).
Isso quer dizer que a pessoa em estado de insegurança alimentar passa por incertezas de quando, como e quanto irá comer em sua próxima refeição, colocando em risco sua nutrição, saúde e bem-estar.
A FAO detalha ainda mais a situação e separa os níveis de insegurança alimentar em quatro categorias – moderada, grave, crônica e aguda.
A insegurança alimentar moderada, por exemplo, acontece quando a pessoa tem sua capacidade de obter alimentos prejudicada devido a fatores como renda ou acesso a recursos. Os indivíduos que estão nesse estágio do problema de alimentação acabam obrigados, em determinadas épocas do ano, a reduzir a quantidade ou a qualidade dos alimentos que consomem.
No estado grave de insegurança alimentar se enquadram as pessoas que não têm acesso à comida, podendo passar fome durante o dia e, nos casos mais extremos, passar dias sem comer.
Já a crônica é a insegurança alimentar que persiste ao longo do tempo, ou seja, uma pessoa que vive por grandes períodos em que há incerteza em relação às suas refeições. Esse nível é comumente relacionado a causas estruturais da sociedade, como o alto preço dos alimentos.
Por fim, a insegurança alimentar aguda é aquela que se estabelece em um nível no qual a falta de alimentos é suficiente para ameaçar a vida ou meios de subsistência de uma pessoa, independentemente da causa, contexto ou duração. Por exemplo, quando a pessoa sofre de desnutrição, com risco de óbito.
Como os dois conceitos são bastante próximos, por vezes eles acabam se confundindo. A insegurança alimentar considera não só a quantidade de alimentos a que a pessoa tem acesso, mas também a qualidade e quais as causas para essa incerteza no que está disponível para comer.
Já a fome é definida pela FAO como um desconforto físico ou dor causada pelo consumo insuficiente de energia alimentar. Entretanto, quem passa fome por conta de causas sociais e estruturais, também se encontra em algum nível de insegurança alimentar.
O termo “fome” também costuma ser usado como sinônimo de subalimentação crônica, ou seja, a condição persistente – que dura muito tempo – na qual o consumo alimentar habitual de um indivíduo é insuficiente para fornecer a quantidade de calorias necessárias para manter uma vida normal, ativa e saudável.
O relatório O Estado da Segurança Alimentar e da Nutrição do Mundo 2021, feito pela FAO, destaca que os principais fatores para o aumento da insegurança alimentar e a desnutrição são os conflitos, as temperaturas extremas no clima e as crises econômicas.
Como exemplos, o documento destaca a guerra na Ucrânia e os demais conflitos que geram ondas de refugiados; a tendência de desaceleração econômica e estagnação em economias mundiais, principalmente com os efeitos da pandemia de Covid-19, que colocou vários países em recessão econômica.
Outro destaque é o aumento da frequência e intensidades de eventos climáticos extremos, os quais geram desastres e colocam milhares de pessoas em situações de vulnerabilidade.
Além disso, o documento também indica que essas causas, combinadas com um aumento das desigualdades sociais, geram um cenário complexo, impactando negativamente a segurança alimentar e a nutrição.
Funcionários e voluntários da Igreja Luterana do Calvário distribuem comida para longas filas de carros. Mineápolis, Estados Unidos.
FOTO DE DAVID GUTTENFELDEROlhando para o futuro, as projeções do relatório da FAO indicam que cerca de 670 milhões de pessoas, ou seja, 8% da população mundial, ainda enfrentarão a fome em 2030.
O número, de acordo com o relatório, se igualaria aos patamares de 2015, quando a meta de acabar com a fome, a insegurança alimentar e a desnutrição até o final desta década foi lançada na Agenda 2030 da ONU.
Considerando as causas para a insegurança alimentar, a FAO indica algumas medidas para combater a fome no mundo. Entre elas estão a integração de políticas humanitárias em áreas de conflito, ampliar a proteção dos sistemas alimentares, como a produção de pequenos agricultores, às mudanças climáticas, e o fortalecimento de programas econômicos voltados a pessoas em situação de vulnerabilidade.
Além desses objetivos, evitar o desperdício de alimentos também é uma forma apontada para diminuir o problema. De acordo com a FAO, um terço dos alimentos produzidos são desperdiçados diariamente, reforçando os cenários de insegurança alimentar.
A boa notícia, é que a maior parte do desperdício acontece em casa e, por isso, é possível diminuí-lo com simples medidas do dia a dia. Confira algumas recomendações de especialistas para evitar a perda de alimentos e colaborar com o combate à fome.