A cúpula do G7 se reúne em Hiroshima, no Japão, entre os dias 19 e 21 de maio. O encontro que agrega algumas das maiores economias do mundo vai ser permeado por discussões acerca da invasão da Rússia à Ucrânia.
O informativo que aponta as questões a serem abordadas na cúpula indica que a guerra “abalou os alicerces da ordem internacional”. Ainda segundo o documento, o G7 respondeu unidamente à invasão e “continuará a promover fortemente sanções contra a Rússia e apoio à Ucrânia”.
“Demonstramos a forte determinação do G7 em defender a ordem internacional baseada no estado de direito, rejeitando firmemente qualquer tentativa unilateral de mudar o status quo pela força ou ameaça de uso de armas nucleares, como a Rússia tem feito, ou o mesmo uso de armas nucleares”, indica.
As palavras reforçam a cisão entre o G7 e o Kremlin, que se estende desde 2014. Naquele ano, a Rússia foi suspensa indefinidamente do grupo — na época conhecido como G8 —, após os demais países membros repudiarem a anexação da Crimeia por Putin.
Para Roberto Georg Uebel, professor de relações internacionais da ESPM, a prioridade ao tema mostra que o G7 procura maneiras de “auxiliar a Ucrânia sem de fato entrar na guerra”, mas também sinaliza uma tentativa de “isolar cada vez mais a Rússia no sistema internacional”.
Após a Rússia anexar a Crimeia, parte da Ucrânia, em 2014, o grupo não apenas afastou o Kremlin, mas também estabeleceu sanções ao país. Aquela foi a primeira violação das fronteiras de um país europeu desde a Segunda Guerra Mundial.
Com o novo avanço russo, dessa vez sobre todo o território ucraniano, os países do G7 aplicaram sanções ainda mais duras e adotaram postura irredutível em relação aos movimentos do Kremlin.
“Alguns atores tentaram manter ao longo destes anos relações comerciais e diplomáticas pragmáticas com a Rússia, como a União Europeia. Mas desde a invasão à Ucrânia, as relações se deterioraram por completo, com acusações mútuas, retiradas de embaixadores. Hoje a relação é frágil e de desconfiança mútua”, aponta Roberto Georg Uebel.
Outros tópicos que vão permear as discussões da cúpula, como alimentos, clima e energia, além de resiliência e segurança econômica, devem ter como centro os efeitos do conflito.
O professor titular do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de São Paulo (IRI-USP) Amâncio Jorge de Oliveira aponta “efeitos colaterais” do movimento do G7 e indica a possibilidade de isso afetar o “equilíbrio do poder mundial”, aproximando ainda mais Rússia e China.
“Vai haver um rearranjo na direção da Ásia contar com a participação da Rússia. E o entendimento entre a Rússia e a China pode definitivamente alterar o ordenamento e equilíbrio do poder mundial”, explica.
O embaixador Maurício Carvalho Lyrio, secretário de assuntos econômicos e financeiros do Itamaraty, explica que o Brasil deve assinar uma declaração sobre segurança alimentar na cúpula, que mencionará os efeitos da guerra para as cadeias de suprimento. Apesar de não fazer parte do G7, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi convidado para o encontro.
“Como é uma declaração sobre segurança alimentar e há efeitos da Ucrânia no acesso a alimentos, uma referência ao conflito deve ser feita no documento. Naturalmente, o governo brasileiro está negociando a linguagem. Há outros países que não fazem parte do G7 e têm posições não coincidentes com as visões do grupo”, disse.
Vinicius Rodrigues Vieira, professor do curso de Relações Internacionais do Centro Universitário FAAP, indica que Brasil, Índia e Indonésia, diferentemente dos membros do G7, não devem assinar declarações “muito duras” em relação à Rússia — já que tendem a ficar neutros em relação ao conflito no Leste Europeu.
Em Portugal, Lula disse que nem Rússia e nem Ucrânia querem parar a guerra / Rodrigo Antunes/Reuters
Ainda segundo Lyrio, na cúpula, Lula comentará a proposta de mediação para a paz. “A questão do desenvolvimento econômico e social dos países em desenvolvimento é sempre um tema do presidente em cúpulas internacionais, assim como a mensagem de paz — ou seja, a necessidade de se pensar a paz para a superação dos conflitos”, completou.
O G7 é a abreviação de Grupo dos Sete, uma organização de líderes de algumas das maiores economias do mundo: Canadá, França, Alemanha, Itália, Japão, Reino Unido e Estados Unidos.
Apesar de o grupo ser restrito às sete nações, comumente outras são convidadas para as cúpulas. Para Hiroshima foram chamados representantes de Austrália, Brasil, Vietnã, Coreia do Sul, Índia, Indonésia, Comores e Ilhas Cook.
Os membros do G7 se reúnem anualmente em uma cúpula para discutir questões urgentes no cenário global e coordenar políticas. A segurança internacional e a economia global são frequentemente tópicos de discussão.
Até a escolha da sede para este ano traz uma “mensagem” para o conflito no Leste Europeu. O encontro acontecerá em Hiroshima, “cidade que se recuperou dos danos catastróficos de uma bomba atômica e que continua buscando uma paz mundial duradoura”, segundo o informativo da reunião.
Segundo o primeiro-ministro do país asiático, Fumio Kishida, por conta da “agressão contra a Ucrânia” e do “risco crescente de uso de armas de destruição em massa”, o Japão demonstra a “determinação do G7 em negar categoricamente as agressões militares, bem como tentativas de derrubar a ordem internacional com significado histórico”.
As reuniões começaram como o “Grupo da Bibliotecas”, fundado na década de 1970 pelo então Secretário do Tesouro dos Estados Unidos, George Shultz. Ministros das finanças dos Estados Unidos, França, Alemanha e Reino Unido se reuniam para “conversas informais” para tentar estabilizar a turbulência cambial.
O Japão aderiu logo depois, e em 1975, com dois dos participantes originais – França e Alemanha – enviando seus presidentes, os encontros tornaram-se reuniões de chefes de estado e de governo. Canadá e Itália logo se juntaram e a cúpula ficou conhecida como o Grupo dos Sete.