À espera de sanção pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o projeto de lei complementar que renegocia as dívidas dos estados tem um impacto fiscal de até R$ 584 bilhões para a União nos próximos 30 anos, segundo estimativas feitas pelo BTG Pactual.
Ao trocar um alívio na taxa de juros por mais investimentos dos governadores, o projeto tem como efeito acelerar as despesas primárias nos estados e diminuir as receitas financeiras da União, piorando o endividamento geral do setor público como um todo.
Nas contas do BTG, com essa repactuação, a dívida bruta do governo deve aumentar até três pontos percentuais acima do cenário-base projetado pelo banco para 2034 — de 95,5% para 98,5% do PIB.
O PLP 121/24, que cria o Programa de Pleno Pagamento de Dívidas dos Estados (Propag), foi aprovado em caráter final pelo Senado na última semana de trabalhos do Congresso Nacional.
Lula tem até o dia 13 de janeiro para sancionar ou vetar o projeto. Não há sinalização, pelo Palácio do Planalto, de objeções à última versão do texto.
O governo federal negociou ativamente, inclusive, mudanças no projeto original — que é de autoria do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).
O Planalto se empenhou para colocar investimentos em educação, infraestrutura e segurança pública como contrapartida para o alívio nos juros cobrados pelo Tesouro Nacional.
Também batalhou por um novo fundo que vai absorver parte dos recursos economizados pelos estados com mais dívidas e direcioná-los para as unidades da federação menos desequilibradas.
A essência do PLP 121/24 é uma redução do indexador das dívidas mantidas pelos estados com a União. Atualmente, cobra-se IPCA + 4% ao ano.
Os governadores têm a oportunidade de trocar o pagamento de juros por mais investimentos em áreas específicas e alguma transferência de recursos aos estados menos endividados.
Cerca de 90% das dívidas totais estão concentradas em apenas quatro estados: Minas Gerais, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Goiás.
De acordo com o projeto, a taxa cairá para IPCA mais juros que variam de zero até 2% ao ano. Existem várias combinações possíveis para a troca do indexador, dependendo fundamentalmente da amortização inicial.
Os estados poderão oferecer a transferência de participação acionária em suas companhias estatais, como empresas de saneamento e energia elétrica, como forma de abater uma parte da fatura.
Como regra geral, o custo do refinanciamento será maior quanto menos o estado antecipar de dívida, aplicar no Fundo de Equalização Federativa e realizar investimentos nas áreas indicadas.
As simulações feitas pelo BTG Pactual, em relatório assinado pelo analista Fabio Serrano, apontam o impacto fiscal máximo com a renegociação das dívidas e contemplam ainda cenários intermediários.
Um ponto de destaque para o banco é que, diferentemente de repactuações anteriores que atrelavam condições mais favoráveis de pagamento das dívidas à realização de ajustes estruturais nas finanças estaduais, o Propag condiciona esse desconto nos juros à realização de novas despesas em áreas específicas.
“Ainda que a proposta em discussão não afete a despesa primária do governo central, o impacto fiscal da medida é relevante”, afirma o BTG Pactual no relatório.
A chave para entender a deterioração das contas públicas é a seguinte: “A renegociação da dívida permitirá aos estados trocar despesa financeira por gasto primário. O efeito no resultado nominal [que inclui gasto com juros] dos entes subnacionais é neutro, mas o seu resultado primário tende a piorar.”
“Por outro lado, a redução do pagamento dos encargos da dívida à União melhora o resultado financeiro dos estados, mas piora o do governo central. Assim, a renegociação da dívida tende a piorar o resultado primário do setor público consolidado.”
No cenário em que os estados decidem não fazer nenhuma amortização inicial, o impacto fiscal acumulado até 2054 cai para R$ 422 bilhões quando com um novo indexador de IPCA + zero e para R$ 147 bilhões no caso de IPCA + 2% ao ano.
“Em um momento em que o cenário fiscal é a principal causa de deterioração da percepção de risco dos agentes econômicos, a aprovação do Propag adiciona mais pressão à dinâmica da dívida pública, ao mesmo tempo em que sinaliza menor disposição para implementar ajustes fiscais necessários”, diz a análise do BTG Pactual.
Desde a década de 1990, houve pelo menos seis renegociações das dívidas estaduais com a União. O Propag é a sétima tentativa de equilíbrio.
Os governadores terão até 31 de dezembro de 2025 para aderir ao novo programa. A partir da adesão, os entes subnacionais poderão fazer uma amortização extraordinária da dívida, o que pode incluir a transferência de companhias estatais.
Veja quais foram os programas anteriores de renegociação entre estados e União: