O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central anuncia nesta quarta-feira, 31, a nova taxa básica de juros (Selic) do País em meio a incertezas fiscais e à piora da inflação de serviços detectada no fim do ano - a despeito da surpresa positiva nos preços dos demais setores.
Com esse cenário, economistas ouvidos pelo Estadão/Broadcast (sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado) afirmam que o BC deve manter a cautela e seguir o plano já anunciado - novo corte de 0,5 ponto porcentual, o que levaria a Selic para 11,25% ao ano -, contando com alguma ajuda do câmbio ao longo de 2024 para, enfim, reancorar as expectativas do mercado para o IPCA nos próximos anos.
No mês passado, o Copom cortou a Selic pela quarta vez consecutiva em 0,5 ponto, para os atuais 11,75% ao ano. O colegiado manteve ainda a sinalização de que esse ritmo de corte continuaria sendo o mais apropriado para as "próximas reuniões". De acordo com levantamento do Projeções Broadcast, a realização de ao menos três novas reduções de 0,5 ponto da taxa Selic, nas reuniões de janeiro a maio, é o cenário de 56 das 60 casas (93%) consultadas.
O economista-chefe do Banco Master, Paulo Gala, afirma que o ambiente externo - que o BC tinha sinalizado como "menos adverso" em dezembro - piorou um pouco. Ele lembra que as apostas do mercado por um corte de juros nos Estados Unidos já em março têm se dividido com expectativas por um começo de ciclo mais tardio, em maio ou junho.
"Houve uma certa euforia do mercado em dezembro que foi revertida, pelo menos no Brasil, com alguma correção. As Bolsas americanas seguem em relativa euforia nos últimos dias, nas máximas históricas, mas o cenário de juros ficou um pouco mais adverso", afirma.
O estrategista-chefe da Warren Investimentos, Sérgio Goldenstein diz que a curva de juros de 10 anos nos EUA subiu um pouco em relação ao último Copom. "Além disso, as tensões geopolíticas voltaram a aumentar. Nas últimas semanas, o preço do petróleo subiu, em função da tensão no Mar Vermelho."
Além disso, Goldenstein afirma que a política industrial anunciada na semana passada aumenta o risco fiscal, por expandir a parcela de crédito subsidiado pelo Tesouro, via BNDES.
"Além disso, é mais um estímulo para a demanda agregada em um momento em que o governo está muito preocupado com a desaceleração da atividade. Pode ser que a pressão aumente, com o risco de o governo recorrer a medidas mais heterodoxas. Essa notícia é algo que pode atuar na contramão da política monetária do BC", afirma.
Já Gala destaca que o risco de mudança de meta de déficit primário ainda persiste, apesar da resistência quase solitária no governo do ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Por outro lado, o economista do Master minimiza o pacote para a indústria que, segundo ele, não tem o tamanho necessário para impactar a potência da política monetária. "O efeito é menor do que se imaginava. Não vai mudar o balanço de riscos, mas o BC deve mostrar que está atento", pondera.
Com as expectativas para o IPCA estacionadas em 3,5% para 2025, 2026 e 2027 - e uma meta contínua de 3% -, ambos os especialistas dizem acreditar que o Copom pode ter uma ajuda do câmbio para trazer as projeções do mercado para o centro do objetivo perseguido pelo BC.
"Temos uma visão otimista do câmbio devido à solidez das contas externas, com uma balança comercial muito superavitária. O real tem tendência de apreciação", afirma Goldenstein. "O que pode limitar o movimento do real seria o Fed (o banco central americano) adotar uma política não tão agressiva como a que está precificada hoje, o que levaria a uma valorização global do dólar."
No mesmo sentido, Gala lembra que a autoridade monetária não realizou nenhum leilão de dólares "novos" em 2023. "O balanço de dólares brasileiro está muito positivo. A taxa de câmbio pode vir a R$ 4,50 ao longo do ano, o que seria um elemento muito forte para trazer expectativas para 3%. E isso independe de o que o BC vai fazer. O risco é uma mudança muito maior na meta fiscal, que poderia afastar o capital do País e impedir essa apreciação do real."