A expectativa do setor agropecuário para que o Plano Safra disponibilizasse R$ 400 bilhões para o calendário 2023/2024 não foi atendida. Expectativa versus realidade, o anunciado nesta terça-feira, 27, pelo Ministério da Agricultura e o BNDES foi o volume de R$ 364,22 bilhões, aumento de 27% em relação ao ano anterior.
Para além do valor, é importante entender o que ele significa na prática. Dos R$ 272 bilhões anunciados para custeio e comercialização, apenas 19% é subvencionado pelo governo -- isto é, o governo garante a diferença dos juros. Os outros 81% (R$ 219,57 bilhões) são recursos livres ou controlados não subvencionados.
"Sabendo que os recursos controlados são, na sua maioria, direcionados aos produtores enquadrados como Pronamp [médio produtor], haverá uma escassez muito grande de recursos controlados ou subvencionados para aqueles enquadrados como ‘demais produtores’", avalia o economista-chefe da Federação da Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul (Farsul), Antônio da Luz.
As taxas de juros para custeio e comercialização serão de 8% ao ano para os produtores enquadrados no Pronamp e de 12% ao ano para os demais. Para investimentos, as taxas variam entre 7% e 12,5% ao ano, de acordo com o programa.
Isso significa que o Plano Safra já nasce com a perspectiva de que não será suficiente para 2023/2024.
Para o vice-presidente da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), José Mário Schreiner, o maior desafio é garantir que os recursos do plano cheguem de "forma contínua, sem ruptura e sem falhas no meio do caminho". "Vamos acompanhar a liberação de recursos para que eles possam chegar aos produtores rurais. E que eles possam, dentro do seu planejamento, comprar seus insumos, suas sementes, e fazer aquilo que sabem fazer com maestria que é plantar e produzir para que tenhamos novamente uma grande safra em 2023 e 2024”, afirmou o vice-presidente da CNA, em nota.
Dos 92,1 bilhões de reais dedicados a investimentos -- aumento de 28% em relação ao ano anterior --, R$ 31 bilhões são livres -- com juros de mercado. O restante, como foi anunciado pelo presidente do BNDES, Aloizio Mercandante, serão os R$ 12,15 bilhões com juros controlados, porém, sem nenhuma equalização.
“A participação do governo no Plano Agrícola e Pecuário é bastante modesta e cada vez menor no montante de recursos ofertados, cabendo ao mercado financeiro, composto por cooperativas de crédito e entidades bancárias, suportar a demanda por recursos sem qualquer tipo de equalização”, afirma Antônio da Luz.
Na avaliação de Paulo Fróes, diretor financeiro da consultoria StoneX, caberá cada vez mais ao capital privado suprir as demandas com outras fontes de recurso, como fundo garantidor solidário e linhas dolarizadas.
“O agronegócio passou a estar na vitrine de investimentos, fruto também do nascimento dos Fiagros", afirma Fróes. "Se o cenário mudou nos últimos anos, as formas de investimento também estão em lá transformação, inclusive, o futuro do Plano Safra.”
Por meio de nota, a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) reconheceu o esforço do governo federal na constituição do Plano Safra 23/24. No entanto, as taxas de juros continuam preocupando o setor.
“A grande questão ainda é o valor destinado para a equalização de taxa de juros, valor que realmente entra na conta para oferecer juro menor ao produtor rural. solicitou um volume da ordem de R$ 25 bilhões para garantir as operações necessárias, mas ainda não sabemos qual o valor fechado pelo governo federal”, afirma a entidade.
Segundo Antônio da Luz, da Farsul, havia expectativa por parte do setor por uma redução de juros, mas não houve alteração relevante.
“Em que pese a modesta participação do governo com equalização de juros, ainda assim vemos imensas dificuldades de que essa parca participação seja cumprida, uma vez que os recursos para custeio programados no orçamento já estão com 87% tomados em maio, quando devem chegar até dezembro”, diz o economista da Farsul. Em relação aos recursos para investimentos, ele diz que já estão com 93% dos tomados.