Incertezas sobre o que será da Petrobras (PETR4) durante o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva seguem como fonte de especulação e volatilidade no mercado. As expectativas, baseadas em experiências passadas, são pessimistas. Controle artificial de preços, reversão de processos de desinvestimento e queda do percentual do lucro distribuído aos acionistas estão entre as principais preocupações de investidores.
A perspectiva se relfete no preço, que se encontra abaixo de duas vezes se comparado ao lucro dos últimos doze meses. Os fundamentos podem indicar uma oportunidade se comparado a outras petrolíferas do Ibovespa, como a PetroRio (PRIO3), com P/L de 9 vezes, e a 3R (RRRP3), com P/L acima de 32 vezes. Mas receios sobre a lucratividade futura da estatal tem levado cada vez menos analistas a indicar a compra da ação.
A fila de bancos e corretoras que rebaixaram a recomendação da Petrobras dá volta nos quarteirões da Faria Lima, passando pelo BTG Pactual, Itaú BBA e Bradesco BBI. Bancos internacionais, como J.P. Morgan e Goldman Sachs endossam a maior cautela. De 12 relatórios compilados pela plataforma TradeMap, somente três ainda recomendam a compra da ação, em lógica inversa à do início do ano passado, quando dividendos robustos e a alta do petróleo internacional eram grandes atrativos da tese.
Em 2022, a companhia encerrou o ano com dividend yield próximo de 50%. Pelo ritmo, o ativo possibilitaria o investidor recuperar todo o valor investido em apenas dois anos e ainda manter intacta sua participação no negócio. Mas as novas projeções são de que o dividend yield seja bem menor neste ano.
Pelas contas do Santander, a proporção do dividendo frente ao preço da ação da Petrobras deve ficar próximo de 8% em 2023. "Ficaria abaixo dos cerca de 10% pagos por empresas da China e Índia e em linha com os 8% das grandes petrolíferas dos Estados Unidos e União Europeia", disse o banco em relatório.
Além da menor distribuição esperada em relação ao lucro (payout) para 2023, a perspectiva de dividendos mais baixos deriva da expectativa de investimentos menos rentáveis e de uma "política de preços menos pragmática", com mais desconto em relação aos praticados no mercado internacional.
Jean Paul Prates, indicado pelo Ministério de Minas e Energia para a presidência da Petrobras, defende a criação de um fundo de compensação para suavizar os efeitos da oscilação do preço do petróleo. O projeto já foi aprovado no Senado, mas segue parado na Câmara desde março do ano passado.
"O fundo faz uma poupança em período de baixa do petróleo no exterior e despeja a reserva em período de alta para reduzir o preço na bomba [de combustível]. Isso é dinheiro do governo, não é da Petrobras", explicou Prates em entrevista recente à Rádio Senado.
O dinheiro do fundo, explicou Prates, será proveniente de dividendos da Petrobras e royalties, que aumentam conforme a petróleo se valoriza no exterior. "Com parte desse dinheiro serão feitos aportes, mas apenas em momentos de crise de abastecimento ou de preços, para reduzir o preço para o cidadão brasileiro."
Prates também disse que "eventualmente" poderá aumentar a capacidade de refino e sinalizou mais investimentos em energia renovável. "Em vez de ficar distribuindo 100% dos dividendos, tem que investir em alguma coisa que tenha futuro de mais de 30 ou 40 anos."
Na segunda-feira, 2, as ações da Petrobras desabaram mais de 6%, após as declarações de Prates e a confirmação de que Lula o indicaria para o comando da estatal.
"As mudanças na Petrobras aumentam ainda mais as incertezas sobre o futuro da empresa e nossa percepção de risco da tese de investimento", afirmaram analistas do Credit Suisse. A expectativa do banco é de mudanças nas políticas de preços, dividendos e de investimentos da própria empresa. "A verdadeira questão é quão drásticas serão essas mudanças." Para o Credit Suisse, Paul Prates deve ter dificuldade em conciliar a frente política com a governança corporativa e o cenário econômico.
O maior foco no pré-sal, onde extrai petróleo a um baixo custo, e desinvestimentos de áreas não prioritárias colocaram a Petrobras nos trilhos da lucratividade nos últimos anos. Nos três primeiros trimestres de 2022, a companhia alcançou R$ 187,8 bilhões de lucro líquido contra um prejuízo líquido de R$ 17,3 bilhões do mesmo período de 2016 -- ano do impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff. Desde então, as ações da estatal mais que triplicaram de preço.
Em busca de maior eficiência, a Petrobras anunciou no fim do ano passado US$ 100 bilhões em investimentos como parte do plano estratégico até 2027. Do total US$ 64 bilhões foi direcionado à área de Exploração e Produção (E&P), sendo 67% somente para o pré-sal. Para o BTG Pactual, qualquer tentativa de mudar o plano "deve ser suficiente para aumentar a volatilidade das ações."
Os primeiros passos para que Prates assuma o comando da maior petrolífera do país já foram dados, com sua indicação pelo Ministério de Minas e Energia e a renúncia nesta quarta-feira, 4, de Caio Paes de Andrade à presidência da empresa. Prates, no entanto, ainda precisa passar pelos comitês internos de eligibilidade e ser eleito conselheiro de administração para, só então, ser confirmado como novo presidente.
A dúvida que paira no ar é se a era do ex-presidente Jair Bolsonaro na Petrobras já terminou, com a renúncia de Andrade, ou se isso só acontecerá de fato a partir da eleição de um novo conselho de administração, em que a maioria será de membros indicados pelo atual governo Lula.