Respirar ar sujo prejudica os nossos pulmões, mas novas pesquisas mostram que isso também pode mudar nossa forma de pensar.
Um estudo publicado no início desta semana na revista "Proceedings for the National Academy of Sciences", dos Estados Unidos, descobriu que a exposição de longo prazo a material particulado, dióxido de enxofre e dióxido de nitrogênio levou a declínios cognitivos nos participantes do estudo à medida que envelheciam. Os homens com menor escolaridade foram particularmente afetados e tiveram baixas pontuações em testes verbais e de matemática.
Os cientistas e as autoridades de saúde ainda estão trabalhando para discernir exatamente como os poluentes do ar interagem com o cérebro.
“Especulamos que a poluição do ar provavelmente causa mais danos à substância branca do cérebro, que está associada à capacidade de linguagem”, diz Xin Zhang, autor do estudo e pesquisador da escola de estatística da Universidade Normal de Pequim.
Estudos anteriores descobriram que os cérebros femininos têm, em média, mais matéria branca do que os masculinos, o que significa que os danos à matéria branca colocariam os homens, com menos matéria branca, em maior risco de sofrer declínios cognitivos.
“São necessárias mais pesquisas para entender os mecanismos”, observa Zhang.
Embora o estudo chinês destaque uma ligação importante, ele precisará ser replicado para quantificar como a poluição do ar altera o cérebro, diz Jonathan Samet, reitor da Escola de Saúde Pública do Colorado. Somente na última década as pesquisas sobre poluição do ar e saúde do cérebro se intensificaram, diz ele, observando que a forma como as partículas entram e revestem os pulmões é mais bem compreendida.
“Os pulmões são o portal de entrada”, diz Samet. “A área dos pulmões é do tamanho de uma quadra de tênis, portanto, há uma enorme superfície a ser atingida. Nós respiramos 10 mil litros de ar por dia.”
Assim como Zhang, Samet diz que mais pesquisas precisam ser feitas para entender os mecanismos exatos de como as partículas de poluição entram no cérebro, quais funções elas afetam e quanto tempo elas duram uma vez lá.
“Eles podem se mover ao longo dos nervos olfativos do nariz até o cérebro ou entrar no sangue”, diz Samet. Ele suspeita que o dano também pode ser causado por inflamação.
Além dos pulmões e do cérebro, estudos também associaram a poluição do ar à saúde ruim do coração e ao diabetes.
“É surpreendente a quantidade de órgãos que parecem ser afetados”, acrescenta Samet.
Como explica o toxicologista ambiental Dan Costa, da Universidade da Carolina do Norte, isso ocorre porque a composição interna do corpo humano é altamente interconectada. Foi demonstrado que a poluição do ar afeta minimamente não apenas os pulmões, mas também o coração, o cérebro e o sistema reprodutivo.
“Quando algo entra [no corpo] que é potencialmente tóxico, suas implicações estão em toda parte”, diz ele. Ele suspeita que os poluentes chegam ao cérebro por meio da corrente sanguínea.
Todo o sangue que sai dos pulmões passa pelo coração, onde é bombeado para o resto do corpo. Costa suspeita que isso acione o sistema imunológico, causando inflamação. Com o tempo, diz ele, o excesso de partículas tóxicas pode causar muita inflamação, o que pode acelerar o envelhecimento do cérebro.
O cérebro é um órgão difícil de estudar, observa Costa. E essa fronteira de pesquisa relativamente nova se torna ainda mais difícil devido às inúmeras variáveis que podem alterar a química desse órgão.
“O cérebro tem uma rede tão complexa de processos”, acrescenta Costa. “Ele tem um nível mais alto de funcionalidade que os outros órgãos não têm.”
É normal que as pessoas vivam hoje em dia mais do que há 70 anos, quando a fuligem negra era lançada na atmosfera. Costa diz que isso pode explicar, pelo menos parcialmente, por que os médicos só agora estão percebendo todas as maneiras pelas quais a poluição do ar permeia o corpo.
“Não apreciamos as sutilezas que estão surgindo agora”, acrescenta.
Costa, que até recentemente trabalhou na Agência de Proteção Ambiental dos EUA, diz que o material particulado, que é gerado por qualquer coisa, desde incêndios florestais até a combustão de combustíveis fósseis, é considerado o poluente do ar mais perigoso para a saúde. No entanto, identificar os impactos de qualquer partícula pode ser difícil porque as regiões com qualidade do ar ruim geralmente têm mais de um tipo de poluente.
Em um relatório publicado este ano, a Organização Mundial da Saúde publicou mostrou que nove em cada dez pessoas no mundo respiram ar ruim no mundo.
“Estamos chegando a um ponto em que muitas vitórias fáceis já foram alcançadas”, diz Samet. As usinas elétricas a carvão e os geradores a diesel continuam sendo algumas das fontes mais perigosas de poluição do ar.
Samet suspeita que o combate a outras formas de poluição do ar exigirá uma mudança de mentalidade na forma de melhor transporte público ou melhor planejamento urbano.