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Veja por que sentir medo pode ser tão bom

Os especialistas avaliam a resposta biológica e psicológica que torna o medo prazeroso.

Publicada em 30/10/23 às 10:31h - 71 visualizações

por Kativa FM \\ National Geographic


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A adrenalina, a dopamina e o cortisol desempenham um papel importante na forma como reagimos a experiências que induzem ao medo, como um passeio emocionante na montanha-russa da Minnesota State Fair, visto aqui. FOTO DE JOËL SARTORE, NAT GEO IMAGE C  (Foto: Kativa FM \\ National Geographic)

Neste ano de 2023, mais de 1.300 pessoas se inscreveram para ter a chance de pagar por uma noite em um quarto de hotel em Chattanooga, no estado do Tennessee, Estados Unidos. Mais especificamente em um quarto que dizem ser mal-assombrado onde Annalisa Netherly foi decapitada por seu amante em 1927.

A popularidade desse lugar é apenas um exemplo da devoção generalizada que muitos de nós têm por sentir medo e passar sustos. Há boas razões, psicológicas e físicas, para gostarmos de nos assustar. 

Nossa resposta biológica ao medo é incrivelmente complexa, envolvendo neurotransmissores e hormônios que afetam áreas do cérebro desde a amígdala até o lobo frontal, explica o Dr. Elias Aboujaoude, professor clínico de psiquiatria e ciências comportamentais da Stanford Medicine e chefe da Seção de Transtornos de Ansiedade. Essa resposta complexa ativa outras emoções, um tanto desagradáveis, como o estresse, quanto agradáveis, como o alívio.

Nossos corpos evoluíram para reagir ao que nos assusta preparando-se para lutar ou fugir: dilatando as pupilas para enxergar melhor, dilatando os brônquios para absorver mais oxigênio e desviando sangue e glicose para órgãos vitais e músculos esqueléticos, diz Aboujaoude. 

Por conta disso, o efeito do medo em todo o corpo pode ser estimulante e, psicologicamente, podemos sentir satisfação ou até mesmo triunfo quando o objeto do medo desaparece. Os especialistas explicam por que o medo pode ser tão viciante, a seguir.

A biologia da emoção

A adrenalina, a dopamina e o cortisol são três substâncias químicas importantes que os seres humanos evoluíram para liberar quando estão sob ameaça ou medo. 

Quando o perigo é detectado, nossos instintos de luta ou fuga são acionados pela liberação de adrenalina. Isso aumenta as funções corporais, como frequência cardíaca, pressão arterial e frequência respiratória, afirma David Spiegel, professor de psiquiatria e ciências comportamentais da Stanford Medicine e diretor do Stanford Center on Stress and Health. “Você pode se sentir vigoroso e com energia", conta.

hormônio do estresse do nosso corpo, o cortisol, é liberado o tempo todo para regular várias funções corporais. Mas o cortisol pode aumentar quando nos esforçamos para superar uma situação ou experiência.

O hormônio pode ajudá-lo a permanecer alerta após a explosão inicial dos hormônios de "luta ou fuga", incluindo a adrenalina, e até mesmo acionar a liberação de glicose do fígado para obter energia durante uma emergência. Quando alguém tem níveis cronicamente altos de cortisol, “isso não é bom para o seu corpo”, diz Spiegel. “Seu corpo está em pé de guerra crônica quando não deveria estar.”

Tanto a adrenalina quanto o cortisol estão associados ao estresse, que pode levar a sintomas físicos de dor no peito, dores de cabeça ou tremores, exaustão, tensão muscular e sintomas emocionais de irritabilidade, ataques de pânico e tristeza. Já a dopamina é mais um neurotransmissor de bem-estar geral. Ela está associada ao prazer e à expectativa ou experiência de uma recompensa, que pode incluir a superação de uma ameaça "como vencer o medo, ganhar uma corrida, receber respeito e aprovação dos outros", diz Spiegel. 

Isso não significa que o objeto do medo precisa ter desaparecido para que a dopamina atinja o alvo: é a antecipação da recompensa, explica Spiegel. Para os viciados em drogas, a dopamina lhes dá uma sensação de prazer durante a perseguição, mesmo antes de a droga ser consumida.

Quando o medo é divertido

Seja em uma casa mal-assombrada ou em uma montanha-russa, Aboujaude diz que o medo pode se tornar emocionante se soubermos que, no final das contas, estaremos seguros. “Certos tipos de experiências podem nos dar a ilusão de que podemos, de fato, dominar e sobreviver a situações ameaçadoras”, diz Aboujaude. “Enfrentar a ameaça parece uma vitória, e pode ser realmente bom enfrentar o que você teme.”

Enfrentar coisas assustadoras pode tirar a sensibilidade de algumas pessoas em relação aos seus efeitos desencadeantes, já que nada de ruim aconteceu, mas isso também pode ter um lado negativo.

“Algumas pessoas sentem mais prazer ou alívio com essas situações de medo e podem acabar flertando com o perigo quando não deveriam”, revela Spiegel. Uma pessoa saudável pode ir esquiar, sabendo dos riscos, e ser cautelosa, diz ele. Alguém em busca de emoção pode ir mais rápido do que sabe que é seguro. “O perigo envolve avaliação de risco e, se você sair do outro lado tendo sobrevivido ao risco, você se sentirá bem com isso.”

Se você notou que a diversão assustadora, como casas mal-assombradas e filmes de terror, geralmente tem como alvo adolescentes e jovens adultos, há uma conexão com isso também. 

“Essa é a idade demográfica que realmente está tentando lidar com a mortalidade - o que eles temem e quão corajosos podem ser", diz Tok Thompson, professor de antropologia da USC Dornsife que ministra um curso sobre histórias de fantasmas. Enfrentar os medos faz parte da vida adulta em todas as culturas, explica o professor.

“Muitas vezes é um empreendimento social, muitas vezes são jovens que estão se testando para ver se uma casa mal-assombrada é realmente mal-assombrada”, diz ele.

O que nos assusta?

Alguns medos humanos são "pré-programados" pela evolução, afirma Alice Flaherty, professora associada de neurologia e psiquiatria da Universidade de Harvard. Nossos ancestrais aprenderam a evitar estímulos assustadores, o que os ajudou a sobreviver e a passar esses instintos para nós. 

“As crianças não precisam aprender a ter medo de barulhos altos, aranhas, cobras, sangue e objetos que se aproximam rapidamente”, diz Flaherty, referindo-se aos chamados medos inatos, que ela diz serem "programados".

Mas a maioria dos outros medos é desenvolvida por meio da experiência, explica ela. Esses medos são tão variados quanto o número de pessoas que os aprendem – desde o medo de cachorros por toda a vida, depois de uma mordida na infância, até o medo de abelhas, depois de uma reação alérgica a uma picada. 

Quando se trata desses estímulos assustadores, as pesquisas mostram que não é necessário que sejam reais para assustar, mas o realismo exacerbado os torna mais assustadores. “Espera-se que uma cobra de verdade seja mais assustadora do que uma simulação de realidade virtual e que, por sua vez, seja mais assustadora do que uma fotografia granulada”, diz Aboujaoude.

Também sabemos que o medo pode variar entre os gêneros, afirma Flaherty. “Todo mundo diz que os homens gostam mais de filmes de terror do que as mulheres, mas há evidências muito boas de que eles se identificam com o predador e as mulheres se identificam com as vítimas”, diz ela. 

Nosso panteão do medo é o motivo pelo qual em um lugar como o Scream-a-Geddon, um grande parque temático de terror em Dade City, na Flórida, você encontrará uma ampla variedade de táticas de susto, diz o diretor de marketing, Jon Pianki. Nesse parque, que inclui palhaços, bruxas, uma cena de prisão e um experimento biocientífico que deu errado, a maioria das pessoas chega em casais ou em um grupo de amigos.

“Não acho que as pessoas se assustem da mesma forma que se assustariam com um encontro em um beco escuro”, afirma Pianki, acrescentando que a experiência no parque foi projetada para "aumentar a ansiedade", mas também com momentos de alívio. “As pessoas entram andando devagar, reunidas em grupos e, assim que o susto acaba, elas saem gritando e rindo.”




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