As queimadas na Amazônia, que registra o maior número de focos de fogo até agosto em 14 anos, estão afetando pelo menos onze estados brasileiros, incluindo os mais distantes, no sul do país. Isso porque os ventos, que costumam levar a umidade da floresta para o Centro-Oeste e o Sudeste, dessa vez estão carregando a fumaça dos incêndios para essas regiões.
A Amazônia registrou em 2024, no intervalo de 1º de janeiro a 20 de agosto, 43.191 focos de fogo, segundo dados do satélite AQUA disponibilizados pelo Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais). É o maior número desde 2010, quando o bioma chegou a 43.948 focos.
Os estados do Pará (21,14%), Mato Grosso (18,09%) e Amazonas (16,77%) são responsáveis por 56% dos focos de fogo no Brasil, do início do ano até essa terça-feira (20). Os municípios do bioma com mais números de incêndio são:
Essa fumaça se soma ainda às que vem do Pantanal, onde, segundo o Ministério do Meio Ambiente, o fogo consumiu mais de um milhão de hectares.
Os estados atingidos pela fumaça são: Amazonas, Pará, Acre, Rondônia, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Minas Gerais, São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul.
A fumaça das queimadas chega aos outros estados pelo vento que vem do oceano, do leste para o oeste, e é desviado para o sul do país pela Cordilheira dos Andes, que faz uma espécie de "barreira" na região. A explicação é do meteorologista Guilherme Martins, da Nottus:
"Esses ventos transportam a fumaça da sua região de origem, no Pará, no Amazonas, e essa fumaça é levada para a região Sul e Sudeste do Brasil, em algumas situações passando pelo Paraguai, Norte e Nordeste da Argentina", diz ele.
Isso acontece todos os anos, segundo o especialista, mas em 2024 a temporada de queimadas chegou mais cedo e está mais intensa. Somada ao período de estiagem, que em 2023 foi ainda mais severa por causa do El Niño, a combinação é perigosa para a natureza e para a saúde dos brasileiros.
Esse corredor de fumaça que atinge quase metade dos estados do país degrada a qualidade do ar, diz Martins. A umidade relativa do ar vem atingindo níveis críticos em grande parte do país, com algumas cidades chegando a 10% – nível parecido com os de áreas desérticas e que está no limiar de emergência da Organização Mundial da Saúde (OMS), que estabelece que a umidade relativa do ar adequada à saúde humana precisa estar acima dos 60%.
Imagens de satélite mostram corredor de fumaça na parte oeste do país | Zoom Earth
Além de pressionar o sistema de saúde, ao causar problemas respiratórios principalmente em crianças e idosos, a fumaça pode causar o fechamento de aeroportos, como já ocorrido em Porto Velho (RO) e Florianópolis (SC).
De acordo com o meteorologista, a seca dos rios no Amazonas, onde o Rio Solimões atingiu a marca de apenas 2 centímetros em Tabatinga, no domingo (18), tem grande impacto no alastramento do fogo. O governo do estado decretou situação de emergência em 20 municípios, enquanto a Agência Nacional de Águas (ANA) declarou situação de escassez hídrica nos rios Madeira (RO e AM) e Purus (AC e AM). Mas é no desmatamento, ele defende, que está o verdadeiro perigo.
"A estiagem tem um grande impacto, porque está tudo seco e há muito material vegetal disponível para queimar. Mas a maioria das queimadas no Brasil é de origem antrópica, ou seja, de causa humana. 98% das queimadas é de causa humana, apenas 2% por causas naturais", afirma. "As queimadas no bioma Amazônia são por causa humana, principalmente associada ao desmatamento", completa Martins.