O coração é a primeira estrutura a se formar no útero.
"No começo, é basicamente um tubo", explica o cardiologista Rohin Francis à BBC.
"Aquele tubo, por meio de um processo de dobradura de origami realmente incrível, eventualmente se torna o coração maduro."
Desde muito cedo no desenvolvimento embrionário bate um coração primitivo.
Gradualmente, à medida que nos desenvolvemos no útero, ele se torna mais complexo, eventualmente formando a estrutura de quatro câmaras com a qual estamos familiarizados.
Assim, quase desde o momento inicial até a morte está sempre batendo. É por isso que tão cedo na gravidez se pode ouvir o batimento cardíaco do feto - aquele som que costuma emocionar os pais durante as consultas de pré-natal.
E esse não é o único aspecto fascinante, diz o cardiologista.
"Se você colocar uma cultura de células cardíacas em uma placa de Petri, mesmo algumas, elas não apenas começarão a bater espontaneamente, mas também sincronizarão umas com as outras."
"Elas têm uma tendência intrínseca de pulsar."
Para isso, as células precisam de muita energia.
"Em comparação com os músculos esqueléticos, as células cardíacas são muito mais eficientes", explica Francis.
"Elas têm um suprimento mais robusto de mitocôndrias, então são células extremamente energéticas."
As mitocôndrias são uma espécie de fábrica de energia da célula.
"Elas criam o ATP que usamos para alimentar todo o nosso metabolismo celular."
O trifosfato de adenosina (ATP) é um composto orgânico encontrado em todas as formas de vida conhecidas. Ele fornece energia para a realização de muitos processos nas células.
E energia é o que é preciso para movimentar qualquer músculo, principalmente o coração, que, mesmo em repouso, está sempre trabalhando muito.
Suas células precisam ser capazes de continuar batendo de forma ininterrupta e, para isso, precisam de níveis muito mais altos de ATP do que os músculos esqueléticos.
Há algo, contudo, que elas têm menos.
"Quando você está falando sobre a sensação de dor na pele ou nos músculos, é muito importante ser capaz de localizar exatamente de onde vem a dor. Assim, o corpo conta com uma alta densidade de nervos sensoriais que irrigam essas partes do corpo para que você possa identificar exatamente de onde vem o problema", detalha o cardiologista.
No caso dos órgãos internos, ele acrescenta, embora seja importante que os órgãos sejam capazes de dizer ao cérebro que algo está errado, a informação não é tão precisa.
"A densidade do nervo sensorial é muito menor."
Parece preocupante, mas seria provavelmente pior se fosse diferente. Isso porque, se não fosse pelo fato de termos muito menos terminações nervosas em nosso coração, o "sentiríamos" constantemente e estaríamos cientes de cada batida... dá pra imaginar?
Por mais maravilhoso que seja o coração, entretanto, ele tem uma grande desvantagem.
"O coração é péssimo em se consertar", pontua Sanjay Sinha, membro sênior da British Heart Foundation e professor de medicina regenerativa cardiovascular da Universidade de Cambridge.
"Quando uma pessoa comum tem um ataque cardíaco ou uma lesão cardíaca, o que geralmente acontece é que parte do músculo cardíaco morre e nunca se recupera."
"Ele se repara formando uma cicatriz - mas a parte do músculo perdida não vai voltar, o que acaba atrapalhando o movimento de contração. É basicamente por isso que é tão sério."
O que há no tecido do músculo cardíaco que não permite que ele se repare da mesma forma que o músculo esquelético?
A razão está na "tendência intrínseca de bater" destacada anteriormente.
Para que um tecido se repare, suas células precisam se multiplicar e, para que se multipliquem, elas precisam se dividir.
"As células cardíacas são especializadas em se contrair, por isso estão repletas de proteínas de miofilamentos contráteis", diz o especialista.
Se uma dessas células se dividisse para formar outra, "você teria que desmontar tudo e depois remontar todo o maquinário contrátil".
Enquanto isso ocorresse, contudo, as células não seriam capazes de se contrair - algo que o coração não poderia se dar ao luxo de fazer, já que está em contínuo uso.
Ou seja, o fato de não poder parar inibe a capacidade do coração de se reparar.
"Se você olhar bem de perto, poderá ver talvez 1% das células do músculo cardíaco se dividindo ao longo de um ano. Isso é muito, muito baixo e não é suficiente para regenerar o coração", afirma Sinha.
Então, o melhor, claro, é cuidar dele. Como?
"O que costumamos aconselhar no momento - e isso é apenas uma orientação - é fazer alguma atividade que o deixe um pouco sem fôlego por pelo menos meia hora três vezes por semana", destaca o cardiologista Rohin Francis.
Fonte: BBC.